Campanha Europeia apela ao fim das patentes ilegais sobre plantas convencionais

Campanha Europeia apela ao fim das patentes ilegais sobre plantas convencionais

2016/03/21 – Está em curso a nível europeu uma campanha que apela à Comissão Europeia e aos Estados Membros da União Europeia para pararem de vez com as interpretações abusivas e a proliferação de patentes sobre plantas naturais ou que resultaram de melhoramento convencional.

A Diretiva 98/44 sobre patentes biotecnológicas, transposta em Portugal pelo Decreto-Lei 36/2003, é clara e não prevê a atribuição de patentes sobre plantas resultantes de melhoramento convencional, ou seja, que não tenham sido geneticamente manipuladas. Contudo o Instituto Europeu de Patentes (IEP), através de uma interpretação fraudulenta dessa diretiva que se tinha comprometido a aplicar, tem concedido sucessivas patentes nos últimos anos. Note-se que é preciso ser criativo para deturpar o disposto no Artigo 4 da referida Diretiva (articulado esse que também consta do Artigo 53 (b) da Convenção Europeia de Patentes) com o teor: “1. Não são patenteáveis: (a) As variedades vegetais e as raças animais; (b) Os processos essencialmente biológicos de obtenção de vegetais ou de animais.”

Assim, e apesar da proibição expressa, a lei vigente foi já torneada pelo IEP em mais de uma centena de casos e várias centenas de pedidos estão atualmente na calha para decisão. Todas essas plantas são alimentos normais que podem ser multiplicados do modo habitual por qualquer agricultor ou até surgir espontaneamente num quintal algures. Muitas delas até já existem, sendo mais ou menos conhecidas. Estas plantas não são resultado de engenharia genética pelo que não são organismos transgénicos (OGM), mas existe, ainda assim, alguma ligação: a maior parte das empresas que pretendem essas patentes são as mesmas que comercializam os OGM, como por exemplo: Monsanto, Syngenta, DuPont Pioneer, etc.

Numa resolução de Dezembro de 2015 o Parlamento Europeu aprovou uma posição clara contra a atribuição de patentes sobre quaisquer plantas convencionais. Os eurodeputados sublinham que as proibições vigentes não podem continuar a ser sistematicamente minadas pelo IEP. A resolução também expressa a preocupação de que os monopólios que controlam cada vez mais as plantas que constituem a base da nossa alimentação se transformem num perigo para a segurança alimentar global, particularmente num mundo instável sujeito a alterações climáticas. As patentes são vistas como sendo contra os interesses dos pequenos e médios produtores e, com esta resolução, o Parlamento reafirma o que já tinha decidido em Maio de 2012.

A campanha da sociedade civil europeia pretende o regresso à legalidade através do cumprimento integral da letra e do espírito da legislação em vigor. É liderada pela coligação No Patents On Seeds! (NPOS) e visa a sensibilização e a ação tanto a nível comunitário como a nível nacional. Recentemente, a 20 de Janeiro de 2016, a NPOS conseguiu uma conquista notável – a revogação da patente sobre o melão resistente a um vírus. Esta patente, tinha sido concedida pelo IEP à Monsanto em 2011. Apesar desta vitória, o problema não se pode resolver caso a caso mas sim, com uma atitude política firme por parte de quem é formalmente responsável pela defesa dos bens comuns que pertencem a todos nós.

Esta campanha toma forma num período em que se anteveem, ao longo de Abril, Maio e Junho, uma série de reuniões e tomadas de posição sobre esta problemática quer a nível dos Estados Membros que integram o IEP quer da Comissão Europeia. Países como a Holanda e a Alemanha já excluíram da sua legislação interna todas as patentes sobre produtos convencionais ou derivados de melhoramento convencional.

A Plataforma Transgénicos Fora (stopogm.net) integra a coligação internacional NPOS e está envolvida nesta campanha. Neste sentido desenvolveu já vários contactos com o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (que se revelou notavelmente opaco à necessidade de diálogo) e aguarda marcação de reunião com o Ministério da Justiça. Pretende-se que o representante português no IEP vote contra todas estas patentes e defenda uma profunda reforma interna que restabeleça a honestidade e credibilidade do IEP. Ao nível da legislação nacional, pretende-se a atualização do Decreto-Lei 36/2003 (tal como na Alemanha) por forma a impedir qualquer interpretação espúria do seu conteúdo.

Falta explicar um aspeto essencial: porque é que o IEP coloca os interesses da indústria acima dos interesses da sociedade? A resposta é simples, como em todos os negócios, é o dinheiro que manda. O IEP é financiado pelas verbas que recebe das patentes que atribui. Quanto mais patentes atribuir, mais dinheiro recebe. O conflito de interesses é gritante mas é neste contexto que se está a decidir um aspeto fulcral da nossa sobrevivência – a soberania alimentar.

Para obter mais informações sobre patentes indevidas consultar este relatório com dados atualizados.

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